22 de abril, 2014




Mantém-se abertas as inscrições para participação no simpósio teológico-pastoral «“Envolvidos no amor de Deus pelo mundo.” Experiência de Deus e responsabilidade humana», agendado para os dias 30 e 31 de maio e 1 de junho, no Centro Pastoral de Paulo VI, em Fátima. A iniciativa é promovida e organizada pelo Santuário de Fátima, sob a coordenação científica da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa, na pessoa do professor José Eduardo Borges de Pinho, que preside à Comissão Organizadora.
 
Em entrevista, José Eduardo Borges de Pinho antecipa as principais perspetivas e temáticas que marcarão os trabalhos. Ponto assente é a intenção de “sublinhar a importância de estarmos atentos aos sinais de Deus no nosso mundo e na nossa vida, acolhendo a sua presença nas mais diversas situações”.  Esta ação teológico-pastoral refletirá também sobre as aparições marianas, e em concreto, sobre as de Fátima, entendidas como sinal do amor de Deus pelo mundo.
 
“Os cristãos e a Igreja em Portugal são chamados, antes de mais, a reconhecer nos acontecimentos de Fátima um dom e um sinal de Deus que os interpela”, afirma José Eduardo Borges de Pinho, professor catedrático docente, de entre outras disciplinas, de Maria no mistério de Cristo e da Igreja; Eclesiologia; e Mariologia.
 
“Em Fátima, sob formas muito diversas, porventura nem todas expressas de acordo com critérios que os caminhos da maturidade da fé sugerem, muitas e muitas pessoas fazem esta experiência do que significa ser amado por Deus e de como a certeza desse amor transforma a vida, e isso acaba por ajudar a encontrar as grandes razões de viver”, sublinha em entrevista. 
 
A entrevista, por LeopolDina Reis Simões, assessora de imprensa do Santuário de Fátima:
 

 
1 - Pode explicar a opção pela formulação “Experiência de Deus e responsabilidade humana” como subtítulo do simpósio teológico-pastoral?
 
Com este subtítulo “Experiência de Deus e responsabilidade humana”, a Comissão que preparou o Simpósio procurou indicar a necessidade de se concretizar o que o tema geral – “Envolvidos no amor de Deus pelo mundo” – sugere. Trata-se de sinalizar que a linguagem cristã do amor de Deus pela humanidade tem de ser percetível e traduzível na vida quotidiana das pessoas, mesmo que nem sempre o reflitam conscientemente ou o digam expressamente. Procura-se, assim e por um lado, sublinhar a importância de estarmos atentos aos sinais de Deus no nosso mundo e na nossa vida, acolhendo a sua presença nas mais diversas situações. Por outro lado, a convicção crente de que Deus acompanha com o seu amor misericordioso o nosso próprio viver e a história do mundo não nos dispensa da nossa resposta, antes pede que sejamos fiéis à nossa concreta responsabilidade nas situações e tarefas que são as nossas, que sejamos testemunhas credíveis dessa presença amorosa de Deus no meio do mundo.
 
2 - A temática proposta, com base nos acontecimentos da aparição de julho de 1917 e na revelação do chamado Segredo de Fátima, aponta para uma forte correlação Divino-Humano e coloca Fátima também como espaço e experiência dessa manifestação. Qual o impacto pretendido?
 
Para além do segredo e de tudo o que o envolveu e envolve, a aparição de julho de 1917 exprime a esperança final de que o amor de Deus é mais forte do que a violência, a força do mal, a injustiça que destrói o Humano, os pecados pessoais e estruturais que afetam as pessoas e o viver da Humanidade. Com essa esperança, feita certeza na fé, o drama da história humana como construção da liberdade não é eliminado: cada um de nós, a Igreja no seu conjunto, a própria Humanidade nas suas diversas expressões históricas, todos estamos implicados nesse drama, que é ao mesmo tempo o projeto de realização das nossas vidas, e temos de assumir o nosso próprio papel e as nossas responsabilidades. Daí, no meu entender, emerge o significado particular das mensagens e dos apelos históricos de teor profético-apocalíptico como advertências a que se acolha com toda a seriedade o tempo que nos é dado viver. Pode dizer-se, creio eu, que se trata de traduzir e de atualizar, em linguagens e simbólicas marcadas pelo tempo e pelas circunstâncias históricas, o anúncio original, também ele profético-apocalíptico (se se quiser, escatológico) de Jesus, sumariado no Evangelho de Marcos: “Completou-se o tempo e o Reino de Deus está próximo: arrependei-vos e acreditai no Evangelho” (Mc1, 15).
 
3 - A meu ver este simpósio centra-se no essencial da Mensagem de Fátima que é a manifestação e mistério da revelação do amor misericordioso de  Deus no mundo através das aparições na Cova da Iria. Fátima continua sinal desse encontro de amor, e também de esperança, entre Deus e o seu povo?
 
Creio que sim: estamos no centro da Mensagem de Fátima, mesmo que os modos de dizer e as perspetivas temáticas possam ter acentuações diferentes nos diversos momentos e lugares dos acontecimentos de Fátima, como tem sido refletido e vai continuar a sê-lo noutros simpósios ou congressos. E julgo igualmente que o núcleo da força significativa que Fátima tem tido e continua a ter, no nosso país e além-fronteiras, tem a ver exatamente com esse centro, ou seja, com o anúncio e a experiência do amor misericordioso, salvífico, renovador de esperança, que brota do Mistério de Deus. Recordo para mim muitas vezes uma palavra marcante de João Paulo II na Christifideles Laici, no número 34, que me parece de transcendente significado na tentativa de dizer o essencial do anúncio cristão de Deus: “O homem é amado por Deus! Este é o mais simples e o mais comovente anúncio de que a Igreja é devedora ao homem. A palavra e a vida de cada cristão podem e devem fazer ecoar este anúncio: Deus ama-te, Cristo veio por ti, para ti Cristo é «Caminho, Verdade, Vida» (Jo 14, 6)!”. Acontece que, muitas vezes, nos perdemos em muitas coisas (desde devoções e gostos particulares a aspetos rituais e doutrinais) e esquecemos este essencial. Em Fátima, sob formas muito diversas, porventura nem todas expressas de acordo com critérios que os caminhos da maturidade da fé sugerem, muitas e muitas pessoas fazem esta experiência do que significa ser amado por Deus e de como a certeza desse amor transforma a vida, e isso acaba por ajudar a encontrar as grandes razões de viver. 
 
4 - Neste sentido, como podem a Mensagem de Fátima e os seus fiéis depositários – refiro-me aqui não só não só à instituição Santuário de Fátima e aos seus fiéis representantes, mas verdadeiramente à Igreja Portuguesa, e também não só a sua hierarquia, mas o povo católico português -  ajudar o mundo a fazer o caminho para a sua própria salvação?
 
Os cristãos e a Igreja em Portugal são chamados, antes de mais, a reconhecer nos acontecimentos de Fátima um dom e um sinal de Deus que os interpela. Vivemos tempos de transformação profunda na maneira como se entende e pratica a identidade católica no contexto europeu e igualmente entre nós. Não há que ver isso só como realidade negativa, de pura e simples negação ou ausência de Deus, por mais que isso seja também um facto e evidencie problemas que devem ser percebidos na sua interpelação: há muita coisa a “morrer” que pode dar lugar a “rebentos” novos de maior verdade e autenticidade na perceção da nossa relação com Deus e na consequente prática que daí deve decorrer. Com Fátima e para além de Fátima, importa que, como cristãos portugueses e Igreja em Portugal, saibamos ler o presente e preparar os caminhos do futuro com esperança, determinação, sentido de humanidade. Se houver algum crescimento nesse aspeto tanto a nível pessoal como comunitário, do nosso testemunho simples e coerente poderá brotar alguma luz e estímulos de renovação.
 
5 - Várias personalidades da Igreja em Portugal e do mundo - lembro aqui o Senhor D. José Policarpo, recentemente falecido - afirmaram a pertinência de a Igreja de Portugal encontrar em Fátima o seu programa pastoral. Qual a sua interpretação desta exortação, feita de vários modos, mas constante e sempre para reafirmar a atualidade da Mensagem de Fátima?
 
Na linha do que referi, creio que, em vários registos, Fátima pode ser – já o tem sido em diversos aspetos – foco impulsionador de um caminho de renovação pastoral. Dou três exemplos, pequenos, mas – creio – não insignificantes. A particular ligação do catolicismo popular a Fátima pode, deve ser, para as comunidades cristãs espalhadas pelo país, bem mais que um traço afetivo-emocional, muitas vezes desligado de uma opção pastoral refletida, de médio e longo prazo, e de uma aprofundamento doutrinal coerente e consequente. Por outro lado, o trabalho que tem sido desenvolvido no Santuário de Fátima aponta – em termos celebrativos, de aprofundamento da fé, etc. – para caminhos de renovação pastoral que nem sempre têm sido devidamente percebidos, valorizados e potenciados. E, ainda outro exemplo, em forma de pergunta: que os nossos bispos se reúnam habitualmente em Fátima não deve ser bem mais do que um lugar relativamente central para esses encontros, mas um questionamento e um estímulo a viverem uma colegialidade muito mais afetiva e efetiva?
 
6 - Que imagens/representações de Deus podemos esperar que nos sejam apresentadas neste simpósio?
 
Creio que a grande “intuição” – também posso dizer “certeza” – que está por detrás da planificação deste simpósio, tanto na mente como no coração dos que o pensaram mais de perto, é a convicção de que de Deus apenas podemos falar por aproximações sempre distantes da Realidade do Mistério que queremos expressar. Dito de outro modo: se o simpósio ajudar um pouco a crescermos todos nesta perceção e na capacidade existencial de nos aproximarmos – parafraseando Karl Rahner – do “Mistério que nós chamamos Deus”, atingiu plenamente os seus objetivos. Porque o nosso grande risco é sempre o de pensarmos e usarmos Deus à nossa imagem e semelhança. Claro que nós todos temos ideias, representações, imagens de Deus: não pode ser doutra maneira (doutro modo não poderíamos falar de Deus!). Mas a consciência desta “distância” é fundamental. Daí que a reflexão que se pretende fazer seja menos marcada pela intenção de “propor” representações de Deus e muito mais pelo objetivo de favorecer um caminho de descoberta por onde passam hoje modos de dizer e de viver a relação com Deus e, simultaneamente, de ajudar a um processo de purificação, para que possamos acolher cada vez mais e melhor o verdadeiro Deus. Nesse sentido, somos sempre de novo reportados a ler e reler o Evangelho de Jesus, como aliás será feito – assim o espero – numa das conferências previstas para este simpósio. 
 
7 - Como sintetiza o papel de Maria na história da revelação divina? 
 
Como todos sabemos, Maria ocupa um lugar único na história da salvação, mas sempre, sempre, em relação a Jesus Cristo e por causa dele. No fundo, Maria é, por graça singular de Deus atuante pelo seu Espírito, o indicativo, o sinal, a garantia, da verdade plena do mistério da encarnação e do seu significado para a humanidade. O grande título mariano, ainda que em rigor “hiperbólico”, é e será sempre “Mãe de Deus”, como o proclamou o Concílio de Éfeso, em 431. Tudo parte daqui e tem por referência esta centralidade cristológica. É neste contexto mais amplo que temos de colocar os sinais de luz, força e esperança que o Deus revelado em Jesus e presente, na história do mundo e no coração das pessoas, pela ação continuada do seu Espírito nos pode ir dando. Neste nosso caminhar na história, o papel singular de Maria, no interior da comunhão dos santos – uma enorme verdade da fé! –, é expressão maternal de um Amor mais forte que a morte, o mal e o pecado que quotidianamente acompanham o nosso viver terreno. 
 
8 – Como caracteriza a tão grande devoção do povo português a Maria? É um sentimento comum ao de outros povos?
 
A devoção a Maria está presente no Oriente e no Ocidente, nos lugares mais diversos do mundo, naturalmente com tonalidades e contextualizações culturais próprias. A devoção do povo português a Maria tem raízes muito profundas, algumas delas certamente ligadas também ao contexto mediterrânico, no sentido amplo do termo, em que nos inserimos: por exemplo, uma sensibilidade particular às expressões afetivas na vivência da fé e a dimensões relacionadas com o feminino (maternais) no modo como nos aproximamos existencialmente do Mistério de Deus e como entendemos a maneira de Deus se relacionar connosco. É igualmente um facto, aliás bem conhecido de todos, que não faltam, ao longo da nossa história, indicativos vários de como a devoção a Maria tem feito parte, com uma espontaneidade que não deixa de ser interpelativa, do catolicismo português, tanto nas suas manifestações mais simples como em expressões mais eruditas, tanto a nível das comunidades cristãs locais como a nível nacional. No fundo, os acontecimentos ocorridos em Fátima assumiram e potenciaram todo um modo de viver a fé que reconhece a importância singular e o significado existencial de Maria nos caminhos da fé, tanto numa perspetiva histórico-salvífica como a nível pessoal e comunitário.
 
 9 - Em relação ao programa do simpósio, vejo como muito pertinente o alargamento da reflexão teológica à apresentação de casos concretos a nível pastoral e social que uma das sessões, na tarde de 31 de maio, propõe. As propostas escolhidas apontarão a seu ver que caminhos?
 
Essa opção prende-se com o que referia a princípio: trata-se de refletir sobre o amor de Deus para connosco não de um modo simplesmente teórico e geral, mas de aprofundar um pouco como é que isso se concretiza na nossa vida cristã, pessoal e social, privada e pública. Em termos de amor praticado, é o indicativo básico da Primeira Carta de S. João: “Se alguém disser: ‘Eu amo a Deus’, mas tiver ódio a seu irmão, esse é mentiroso; pois aquele que não ama o seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê”(1 Jo 4, 20 s.). No mesmo sentido, procura-se também refletir sobre aspetos da realidade vivida pelas pessoas em termos de consciência do pecado e sobre formas renovadas de reconciliação enquanto expressões eclesiais de sinalização do amor misericordioso de Deus. Trata-se aqui, pois, de procurar concretizar dimensões fundamentais da vida cristã, nem sempre tão presentes como deveria acontecer.
 
10- Qual o relevo do Santuário e da Mensagem de Fátima para a Igreja em Portugal e para o Mundo?
 
Eu creio que cada pessoa que vem a Fátima – português ou estrangeiro – tem a sua própria história de vida e de fé. E, portanto, há sempre uma dimensão pessoal-subjetiva que deve ser acolhida e respeitada, não podendo cair-se em generalizações sempre simplificadoras. O que um vê ou sente, outro pode não ver ou sentir. Mas, em termos globais, e como nos tem sido sugerido pelas instâncias mais representativas da Igreja, Fátima emerge sobretudo como um lugar de interpelação à busca permanente de Deus e de redescoberta do que o Evangelho de Jesus pode significar para a humanidade do Homem. Esta advertência básica, verdadeiramente profética, tem cada vez mais atualidade, como todos os dias se comprova: quanto mais se ignora a questão de Deus, quanto mais nos fechamos em nós próprios e em critérios intramundanos, menos nos tornamos capazes de acolher verdadeiros e consistentes valores de vida, menos teremos forças para nos decidirmos por uma mudança profunda de critérios de juízo e ação, menos seremos capazes de nos abrirmos às exigências da justiça, da solidariedade e da paz. E, em última análise, é o nosso futuro – como pessoas, como país, como Europa, como Humanidade... – que está em jogo. 
 
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