06 de novembro, 2024

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O santo guerreiro que era devoto de Nossa Senhora

Hoje, celebra-se a festa litúrgica de São Nuno de Santa Maria, perpetuado pelo exemplo de fé, na Igreja, e pela arte, no Santuário de Fátima.

 

A Igreja celebra neste 6 de novembro a memória de São Nuno de Santa Maria, que no Santuário de Fátima é evocado numa das principais estátuas presentes no topo da Colunata. Esta figura central da história e da devoção portuguesas faz-se presente em Fátima não apenas através da estátua que o figura já como carmelita, mas sobretudo pelas inúmeras referências que dele existem no mensário oficial do Santuário, Voz da Fátima, que no dia da sua festa litúrgica revisitamos, em jeito de percurso biográfico.

São Nuno de Santa Maria, nascido Nuno Álvares Pereira (1360 – 1431), foi um nobre e estrategista militar português conhecido pelo seu papel no período de instabilidade política que Portugal viveu após a morte de D. Fernando I e, sobretudo, por defender a independência de Portugal, na Batalha de Aljubarrota.

Devoto fervoroso de Nossa Senhora, entrou para a Ordem do Carmo após a vida militar, dedicando-se à caridade e oração, tendo sido beatificado quase cinco séculos depois, a 23 de janeiro de 1918, e canonizado a 26 de abril de 2009.

 

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Tendo as aparições na Cova da Iria ocorrido um ano antes da beatificação, os primeiros anos de Fátima foram vividos em paralelo com uma natural intensificação da devoção ao então recém-criado beato Nuno de Santa Maria.

Esta relação é notória no próprio mensário Voz da Fátima, concretamente na capa do seu primeiro número, de 13 de outubro de 1922, em que, na única imagem da edição inaugural, figura uma representação de D. Nuno Álvares Pereira, abaixo da qual é estabelecido um elo profético entre a lenda de que ele teria orado na Cova da Iria, antes da batalha de Aljubarrota, e as aparições marianas de 1917.

Além desta representação, o próprio cabeçalho da publicação [foto acima] assume uma gravura da bandeira associada ao beato e a silhueta do Mosteiro de Santa Maria da Vitória, na Batalha, que fora edificado como agradecimento pela vitória na Batalha de Aljubarrota.

Nos primeiros anos, a Voz da Fátima apresenta inúmeras referências diretas ou indiretas a Nuno de Santa Maria. Na edição de julho de 1924 do mensário, nas regras que D. José Alves Correia da Silva definia para a recém-criada Associação Servos de Nossa Senhora de Fátima (atuais Servitas de Nossa Senhora de Fátima), o então beato Nuno de Santa Maria era apresentado como exemplo “na devoção a Nossa Senhora”.

Quatro anos depois, na mesma publicação, o cónego Manuel Nunes Formigão, sob o pseudónimo Visconde de Montelo – com o qual escrevia na Voz da Fátima – referia-se ao ainda beato como o “Santo Condestável” – designação assumida pelo povo, desde a sua morte, baseada na fama de santidade – , ao noticiar uma peregrinação a Fátima da Cruzada Nacional Nun’Álvares Pereira, fundada em julho de 1918.

 

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A grande devoção a Nossa Senhora

Os 500 anos da morte de Nuno de Santa Maria foram assinalados com destaque na Voz da Fátima de agosto de 1931, onde é publicada na capa a estátua do beato que seria inaugurada a 14 de agosto, no mosteiro da Batalha, curiosamente feita pelo mesmo escultor da Imagem de Nossa Senhora do Rosário de Fátima, José Ferreira Thedim.

No artigo, onde são relatados os feitos históricos de Nuno Álvares Pereira, o agora santo é adjetivado como “incontestável estrela de primeira grandeza no céu puríssimo da religião e da história portuguesa”.

Num texto que se prolonga da capa para a página dois, é caracterizada a fé que “alimentava a dedicação patriótica” de Nuno de Santa Maria, assente na devoção à Eucaristia, no amor à pureza e na caridade, que culminaram com uma “morte santa”. Na conclusão, justifica-se a associação do Santuário às comemorações do falecimento do beato.

“O Santuário da Fátima associa-se com todo o entusiasmo às festas comemorativas do centenário da morte do Beato Nuno, não só porque foi um grande devoto de Nossa Senhora e este Santuário está situado no Condado de Ourém, que pertencia a Nun'Álvares, mas também porque, no centro de Portugal, faz suas as grandes glórias nacionais”.

Dez anos depois, a referência a Nuno Álvares Pereira volta à primeira página, num breve texto onde o padre Galamba de Oliveira lamenta o “resfriar” da devoção ao beato e define um caminho “em prol da canonização de Nuno de Santa Maria”.

A promoção do culto ao beato e a insistência na sua canonização passam a ser uma constante na Voz da Fátima, nos anos que se seguem, em artigos assinados pela redação ou em textos dos leitores.

O processo de canonização, iniciado em 1921, viria a ser interrompido em 1940, por razões políticas, mas em Fátima, as menções ao beato não cessaram e, na notícia da peregrinação de outubro de 1955, há inclusivamente referência à intenção “de suplicar a Deus os necessários milagres para a canonização do Beato Nuno de Santa Maria”.

Seis anos depois, na notícia da peregrinação mensal de fevereiro de 1961, é referida a presença das relíquias do beato na Cova da Iria, no âmbito dos 600 anos do seu nascimento, relíquias estas que voltariam a poder ser veneradas no Santuário em agosto de 1985.

 

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Oração, entrega a Deus e perseverança na fé

A reabertura do processo de canonização só viria a acontecer quase meio século depois, em 2004, pela iniciativa da Ordem do Carmo e do Patriarcado de Lisboa, retoma esta que viria a culminar na autorização da promulgação de dois decretos que reconhecem o milagre atribuído a Nuno de Santa Maria e as suas virtudes heroicas.

A cura milagrosa reconhecida pelo Vaticano foi relatada por Guilhermina de Jesus, uma sexagenária natural de Vila Franca de Xira, que pediu a intervenção do Santo Condestável depois de, no ano 2000, sofrer lesões no olho esquerdo por ser atingida com salpicos de óleo a ferver quando estava a fritar peixe. O processo foi analisado por diversos médicos em Portugal e foi analisada por uma equipa de cinco médicos e teólogos em Roma, que consideraram ter havido intervenção miraculosa.

A canonização de Nuno de Santa Maria a 26 de abril de 2009, pelo Papa Bento XVI, faz renascer o interesse pela devoção e trouxe o nome do novo santo às páginas da Voz da Fátima. Entre as mais recentes referências, destaca-se o artigo onde o então diretor do Serviço de Estudos do Santuário, padre Luciano Cristino, minucia a relação entre São Nuno de Santa Maria e Fátima, lembrando a devoção do santo a Nossa Senhora e a tradição, não documentada, que o coloca na Cova da Iria, no caminho que fizera para a Batalha de Aljubarrota.

Na homilia da missa da canonização, o Papa Bento XVI sintetiza a personalidade santa de Nuno de Santa Maria.

“Sinto-me feliz por apontar à Igreja inteira esta figura exemplar nomeadamente pela presença duma vida de fé e oração em contextos aparentemente pouco favoráveis à mesma, sendo a prova de que, em qualquer situação, mesmo de caráter militar e bélico, é possível atuar e realizar os valores e princípios da vida cristã, sobretudo se esta é colocada ao serviço do bem comum e da glória de Deus.”

Pela sua devoção a Nossa Senhora, entrega a Deus e pelo seu exemplo de perseverança na fé, por meio da oração, São Nuno de Santa Maria permanece como um notável testemunho de fé, alinhado com a própria mensagem de Fátima.

O “Santo Condestável” está perpetuado no Santuário de Fátima, numa estátua que encima a Colunata desde finais de 1954, da autoria de Salvador Barata Feyo, onde é figurado já como carmelita, ordem na qual viria a falecer a 1 de novembro de 1431, com 71 anos.

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