11 de agosto, 2009

Na sua homilia no Santuário de Fátima, D. Alexandro Ruffinoni deixou sobertudo uma mensagem de esperança e um apelo ao bom acolhimento aos migrantes.
 
"O migrante não é um estrangeiro, mas um mensageiro de Deus que surpreende e rompe a regularidade e a lógica da vida quotidiana. No migrante a Igreja vê Cristo que “coloca a sua tenda no meio de nós” (Jo 1,14) e que “bate à nossa porta (Ap 3,20). Feliz daquele povo que sabe acolher e abrir a porta ao migrante, porque encontrará mais paz e alegria".
 
"O migrante nunca pode ser considerado como um problema, nem pela Igreja, nem pelo Estado que o acolhe, e sim uma riqueza de grande valor de que devemos agradecer a Deus.", disse.
 
Considera o prelado que o migrante conhece, no que concerne ao acolhimento, apenas dois idiomas,o de Caim e o de Abel. "Não me perguntem quantos idiomas eu falo, porque para o migrante, há apenas dois idiomas. O idioma de Caim e o de Abel. O de Caim é o do ódio, da inveja, da humilhação, do engano, do aproveitamento, da esperteza, da prisão, da deportação, das patrulhas,das rondas... Já o idioma de Abel é o do amor, da acolhida, da solidariedade, do perdão, da fraternidade, da amnistia".
 
 
 
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Homilia em Fátima
1ª leitura: Prov 8, 17-21.34-35
2ª leitura: Col 3, 1-5
Evangelho: Lc 2, 15b-19
 
“Migram os pássaros e os animais, levados pelo instinto; migram as sementes nas asas dos ventos; migram as plantas de continente a continente, levadas pelas correntes das águas e, mais que todos, migra o homem, instrumento daquela Providência que preside e guia os destinos humanos, para a meta, que é o aperfeiçoamento do homem e a glória de Deus” (Scalabrini).
Assim o Pai e Apóstolo dos migrantes, João Batista Scalabrini, via as migrações: um instrumento da Providência para espalhar no mundo a fé, o progresso e a solidariedade.
Na carta a Diogneto está escrito: “Para o cristão toda terra estrangeira é pátria e toda pátria é terra estrangeira.... o cristão habita a terra, mas é cidadão do céu”.
 
É intenso e profundo pensar num mundo sem fronteiras, sem a palavra estrangeiro, pois esta é uma palavra triste, fria, uma palavra que separa e divide...
Na Igreja ninguém é estrangeiro, disse o Papa João Paulo II°, todos somos irmãos e irmãs, filhos e filhas do mesmo Pai.
Jesus disse: “Não vos chamo servos... mas vos chamo amigos...”. Somos todos da mesma família de Deus. A Igreja é mãe e como mãe acolhe a todos e aceita todas as etnias.
 
Não me perguntem quantos idiomas eu falo, porque para o migrante, há apenas dois idiomas. O idioma de Caim e o de Abel. O de Caim é o do ódio, da inveja, da humilhação, do engano, do aproveitamento, da esperteza, da prisão, da deportação, das patrulhas,das rondas... Já o idioma de Abel é o do amor, da acolhida, da solidariedade, do perdão, da fraternidade, da amnistia... Não importa se sou italiano, português, brasileiro, americano, chinês ou japonês. Aquilo que é realmente importante é que somos todos feitos a imagem e semelhança de Deus.
Neste contexto, poderíamos nos perguntar: Que sentido tem esta peregrinação dos migrantes ao Santuário de Fátima? Por que reunir tanta gente ao redor de uma mesa eucarística, na casa da nossa Mãe comum, Maria Santíssima? Os motivos são muitos, queridos irmãos e irmãs. A Igreja como demonstração de amor e carinho, quer dizer aos seus filhos e filhas que reconhece a trajetória de cada um; que não os esqueceu, apesar de estarem longe, dispersos pelo mundo inteiro; que os acompanha com sua prece, para que não cansem e não desanimem na busca de uma vida melhor.
A Igreja, hoje e sempre, quer dizer, também, a todos vocês e a todos os migrantes do mundo um muito obrigado pelo trabalho realizado, pela contribuição com o progresso das nações que os acolhem. Vocês são sementes de Deus que espalham com a sua vida e o seu testemunho a fé, os costumes e as tradições de sua pátria, enriquecendo, assim, os povos com os quais estão convivendo.
Vocês são como os pastores de Belém, que após haverem visto e adorado a Jesus na manjedoura partiram para proclamar as maravilhas de Deus. Muita gente ao receber, vocês migrantes, se contagia com sua fé e acredita em Deus. Vocês partiram como simples discípulos e pastores e tornaram-se grandes missionários em nosso mundo. Quantas lindas histórias poderia aqui contar de migrantes que plantaram no meio da floresta, no meio das grandes metrópoles, nas planícies e nos montes, com a ajuda de um simples quadro, ou imagem, um grande santuário ou uma grande Catedral ao redor dos quais se desenvolveram uma fé e uma tradição cristã. Em viagens ao Japão e aos Estados Unidos constatei como a presença dos migrantes é uma forte contribuição para o crescimento de valores cristãos e humanos entre as pessoas.
Por isso, o migrante nunca pode ser considerado como um problema, nem pela Igreja, nem pelo Estado que o acolhe, e sim uma riqueza de grande valor de que devemos agradecer a Deus.
Na recente Encíclica Caritas in Veritate, o Papa Bento XVI chama a atenção para o fenômeno das migrações na contemporaneidade. “É um fenômeno impressionante pela quantidade de pessoas envolvidas, pelas problemáticas sociais, económicas, políticas, culturais e religiosas que levanta, pelos desafios dramáticos que coloca às comunidades nacional e internacional. Pode-se dizer que estamos perante um fenômeno social de natureza epocal, que requer uma forte e clarividente política de cooperação internacional para ser convenientemente enfrentado. Esta política há-de ser desenvolvida a partir de uma estreita colaboração entre os países donde partem os emigrantes e os países de chegada; há-de ser acompanhada por adequadas normativas internacionais capazes de harmonizar os diversos sistemas legislativos, na perspectiva de salvaguardar as exigências e os direitos das pessoas e das famílias emigradas e, ao mesmo tempo, os das sociedades de chegada dos próprios emigrantes. Nenhum país se pode considerar capaz de enfrentar, sozinho, os problemas migratórios do nosso tempo (...). Todo o imigrante é uma pessoa humana e, enquanto tal, possui direitos fundamentais inalienáveis que hão-de ser respeitados por todos em qualquer situação” (62).
Também no Documento de Aparecida (maio 2007) os Bispos Latino-americanos e Caribenhos recordam o dever do acompanhamento pastoral dos migrantes, afirmando: “Entre as tarefas da Igreja em favor dos migrantes está a denúncia profética dos atropelos que eles sofrem frequentemente. Como Igreja que ama seus filhos devemos nos esforçar para conseguir uma política migratória que leve em consideração os direitos das pessoas em mobilidade” (DAp 414).
 
A Igreja, dioceses e paróquias, deve dar o exemplo para uma melhor acolhida dos migrantes, ajudando os fiéis a superar preconceitos e prevenções. Ela é chamada a ser encontro fraterno e pacífico, casa de todos, edifício sustentado pela verdade, pela justiça, pela caridade e pela liberdade (João XXIII). Onde está o povo que sofre e trabalha, aí deve estar a Igreja (Scalabrini)
O migrante não é um estrangeiro, mas um mensageiro de Deus que surpreende e rompe a regularidade e a lógica da vida cotidiana. No migrante a Igreja vê Cristo que “coloca a sua tenda no meio de nós” (Jo 1,14) e que “bate à nossa porta (Ap 3,20).
Feliz daquele povo que sabe acolher e abrir a porta ao migrante, porque encontrará mais paz e alegria.
 
Uma palavra, agora, aos migrantes Brasileiros presentes nesta peregrinação e que encontraram, nesta nação, acolhida e trabalho. Como bispo encarregado pela CNBB  da pastoral dos migrantes brasileiros no exterior (PBE), quero dizer-lhes que a Igreja do Brasil é orgulhosa de todos vocês, pela sua fé, pelo trabalho e pelo espírito de alegria que contagia a todos. Todos os anos, no mês de junho, celebramos, nas Dioceses do Brasil, a semana do migrante e é precisamente neste tempo que elevamos a Deus as nossas preces para os migrantes, de maneira especial recordando os 4 milhões de brasileiros/as espalhados no mundo. Como responsável da pastoral para os brasileiros no exterior, queremos ser ponte entre a sua pátria de origem e a nova pátria que os acolhe. Queremos dialogar e pedir encarecidamente aos nossos irmãos bispos e sacerdotes, que agora são os seus pastores, para que façam o possível, para que não lhes falte acompanhamento espiritual e o apoio fraterno.
 
Permitam que termine a minha mensagem fazendo uma prece a nossa Senhora de Fátima.
 
Ó Virgem e Nossa Senhora de Fátima, Mãe dos peregrinos. Ensina-nos o caminho do amor e da fraternidade. Fica conosco nos momentos de desânimo e de tristeza. Fica conosco quando ao redor de nossa fé surgem as dúvidas e as dificuldades. Fica em nossas famílias para que continuemos sendo ninhos de amor, respeito e união. Fica com aqueles nossos irmãos e irmãs que mais sofrem em terras estrangeiras, porque não tem casa, trabalho e comida. Olha com carinho às nossas crianças e aos jovens. Que possam crescer como o teu Filho Jesus, em idade, bondade e sabedoria. Que eles nos ajudem a fazer desta terra um lugar de fraternidade e de paz. Fortalece a todos na fé para que sejamos discípulos missionários de teu Filho Jesus.  Amém.
Viva Nossa Senhora de Fátima!
 
+  Alessandro Ruffinoni
 
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