13 de dezembro, 2023

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“A oração de Fátima implica um sentido reparador que é muito mais exigente”

José Rui Teixeira fala das orações de Fátima.

O acontecimento de Fátima e a sua leitura, a partir das primeiras quatro Memórias escritas pela Irmã Lúcia de Jesus, entre 1935 e 1941, já religiosa Doroteia, apontam para uma consciência de pecado, que nos precede e que exige uma permanente reparação, não só centrada em cada um mas no mundo, afirma José Rui Teixeira, teólogo e autor da biografia que acompanha o processo de beatificação e canonização de Lúcia, no podcast #fatimanoseculoXXI, que a Sala de Imprensa do Santuário publica mensalmente e que está disponível em www.fatima.pt/podcast e nas plataformas iTunes e Spotify.

«Esta necessidade de uma oração que repare o mundo, neste amor incondicional ao Imaculado Coração de Maria, torna-se uma evidência na formulação das orações de Fátima, que apontam para uma semântica da transcendência» afirma o investigador.

“Torna-se difícil transmitirmos pelas palavras humanas esta dimensão, este caráter sacrificial, que é áspero para nós, quando lemos as orações que o Anjo e Nossa Senhora ensinaram às crianças, ou o descritivo das aparições, e também nós sofremos com o caráter sacrificial das crianças que fazem penitências para desagravar os pecados do mundo, de forma gratuita».

«Este é um enormíssimo desafio que aqui em Fátima incide particularmente sobre a consciência do pecado e sobre a necessidade permanente não só de uma penitência em sentido mais físico ou mais exterior, mas particularmente de uma comparação profunda interior que permita que esta redenção não seja uma espécie de cosmética ou de paz podre que se estabelece entre as pessoas ou entre as realidades , mas que seja mais profundamente a resposta afirmativa e ontológica de todos os seres ao projeto de Deus», explica José Rui Teixeira, que entende que o « grande desafio é integrar este caráter sacrificial e penitencial, reparador, na nossa própria oração», não no sentido físico mas ontológico.

O Teólogo, que ao longo da conversa reflete sobre as designadas orações de Fátima, apresentadas por Lúcia aquando da elaboração das Memórias e que resultam do colóquio com o Anjo, em 1916, e depois nas seis aparições de Nossa Senhora, em 1917, afirma que «são orações muito centradas nesta questão da adoração a Deus, mas com uma dimensão própria do acontecimento de Fátima, que é intrinsecamente histórico e, por isso, tem pouco de abstrato». «Fátima tem esta dimensão: é um fenómeno marcadamente espiritual, mas com um enraizamento histórico grande, e as orações têm de ser lidas e vistas assim, pois são-nos ditas a partir da memória de Lúcia», prossegue.
«Além da adoração, têm um caráter sacrificial e penitencial muito relevante e que não pode ser desvalorizado, até porque Fátima tem este caráter reparador que importa ter em consideração», esclarece.

“Enquanto Portugal não entra na guerra, este pesadelo não entra no quotidiano das pessoas; é a ida dos nossos rapazes para a guerra que faz com que esta noite escura, este pesadelo que é um conflito desta natureza entre no dia a dia dos portugueses. E aí aparece essa ligação histórica, que Lúcia faz sempre, entre o pecado do mundo e as consequências desse pecado. E Lúcia faz essa hermenêutica desde criança, o que é muito interessante, e depois, já em adulta, com uma consistência muito grande com a sua maturidade, a sua consagração», clarifica José Rui Teixeira.
«As orações de Fátima são muito duras, porque a primeira reação que temos é exatamente considerarmos ininteligível, à luz do mundo, do nosso mundo, essa oblação gratuita, esta capacidade de sentir que no espaço da minha interioridade reparo um mal que me antecede e que, aparentemente, sem esperança, nunca mais me deixará, independentemente da minha predisposição pessoal para o reparar».

«Há uma semântica que não é apenas a semântica que pode ser interpretada à luz do conhecimento teológico ou antropológico ou sociológico da religião. É uma semântica da predisposição, ou seja, de uma abertura à escuta e à contemplação, que permite que Deus aconteça em silêncio, no ruído que tantas vezes opera no coração da minha vida. E isso é o tal grande desafio que a oração de Fátima nos coloca: a tal oração dura, a tal oração do contexto, que é o facto de estarmos a falar de três crianças com um tremendo grau de desproteção em relação ao mundo...». E, nesse sentido, «Fátima comove-me tremendamente por ser esta caixa de ressonância da capacidade de amar incondicionalmente, de esperar contra toda a esperança e de ser, de amar nesta realização teologal da vida que é absolutamente eloquente, poética e também convidativa à contemplação», afirma José Rui Teixeira.

«O que aconteceu a estas três crianças, cujo o nome e a vida conhecemos tão bem, ao ponto de as considerarmos santas, é um desafio à nossa vocação de cristãos, ao que somos chamados a realizar neste processo de oração», que será sempre «um confronto com o silêncio, com muita ausência, com o abandono, porque é aí que dialogamos e escutamos, mas, infelizmente, e não se trata de um exercício de alteridade, nós temos uma grande dificuldade, não só de falar com Deus, porque  também a temos, mas sobretudo de O escutarmos”.

E, «nas horas mais sombrias falta-nos a esperança», acrescenta, afirmando que historicamente, e olhando para o mundo atual, «revelamos uma profunda incompetência para o bem». “Nós como cristãos revelamos, historicamente em termos individuais, de vivência de grandes comunidades, nas nossas paróquias, nos nossos santuários, ou até na nossa oração pessoal, quando fechamos a porta do nosso quarto, uma enorme fragilidade, e isso temos de o admitir com muita lucidez», afirma. «Nós nem podemos ter a ideia da verdadeira eficácia da nossa oração, porque somos muito pobres a fazê-la».

«De facto, este drama de um Cristianismo sem a verdadeira oração revela-nos o resultado sociológico do impacto do Cristianismo e denuncia-nos na incapacidade de realizarmos o nosso batismo. Está tudo ligado», diz ainda.

«Seria muito interessante nós cristãos pensarmos em estar menos autocentrados e autorreferenciais em relação à Instituição que somos e pensarmos muito mais nesse grande estaleiro que é o mundo, que era suposto que nós transformássemos em reino de Deus, e isso não se consegue apenas pela ação social — que é importantíssima, embora não seja a única forma —, mas também por trazermos o Evangelho para o meio. É o fermento na massa, é o sal da terra e a luz do mundo».

Neste podcast, o Teólogo reflete sobre a «sociedade do ruído» que nos convoca «à impaciência» e «à falta de capacidade de amar».

«As grandes histórias não são nunca edificantes, e este é um pressuposto de grande honestidade quando falamos de Fátima. Nós gostaríamos de olhar para um fenómeno como Fátima e que tudo tivesse uma certa docilidade que está nos antípodas daquilo que é, e foi, para estas três crianças».

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