13 de dezembro, 2020

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DESPEDIDAS, ABRAÇOS, BALANÇOS E SAUDADES

 

O mês de Dezembro é favorável aos balanços do passado e aos propósitos para o futuro. Chegamos ao fim de cada ano quase sempre com necessidade de parar para avaliar. Para refletir e perceber como vivemos, o que conquistámos, onde falhámos e o que fazer para voltarmos a sentir-nos inteiros.

A unidade interior é, porventura, um dos meus maiores propósitos de vida. Maior e mais recorrente, pois é quando tudo nos divide e tanta coisa nos rasga por dentro que sinto que mais preciso de juntar o que anda disperso em mim. Voltar a sentir essa unidade interior é tão importante como ter a certeza de haver chão e caminho para percorrer.

O silêncio e a oração ajudam-me diariamente a colar os fragmentos, por assim dizer. A reconstruir o puzzle interior, onde as peças não encaixam de forma linear. Vou à Missa todos os dias em busca da Palavra, mas também do silêncio e do recolhimento onde me sinto capaz de puxar o filme atrás para ver como vivi o meu dia.

O mês de Dezembro e, de forma especial, o tempo de Advento atravessa-nos de forma diferente. Primeiro por celebrarmos o nascimento de Jesus e a grande e fecunda espera que O antecedeu. Depois, porque nasce também em nós uma urgência de vida nova, com mais sentido e intimidade com Deus.

Sabemos que este nascimento não acontece no coração de todos os homens e mulheres que habitam a Terra, mas sentimos entre católicos uma maior fraternidade, uma maior proximidade e atenção ao Essencial.

Este mês de Dezembro ficará para a História como o derradeiro tempo de um ano com tanto de esmagador e demolidor, como de transformador. Curiosamente estas três palavras que acabo de escrever terminam em ‘dor’. Não me dei conta, mas agora que as tenho mais presentes dou comigo a pensar como a dor as atravessa e marca. Especialmente a última, que tem um sentido renovador (mais uma a acabar em dor) e assume, ela própria, que transforma a dor.

Abro um parêntesis para reforçar este olhar sobre as palavras, porque elas contam e a forma como as usamos também. Transformar a dor é aquilo que nos é pedido a cada passo. A dor da perda, da incompreensão, das fraturas, dos fracassos, do que deixámos de ter, dos que deixámos de ver, visitar, abraçar, dizia eu que a dor que tudo isto nos provoca pode ser usada como motor ... transformador. E fecho parêntesis, para não ficar aqui numa espécie de quebra-cabeças ou sudoku de palavras e a sua etimologia.

Volto ao mês de Dezembro por ser o último de 12 vividos em cúmulos de perplexidade e sofrimentos pelos estragos provocados pela pandemia. Foi um ano difícil, não há dúvida que foi, mas está a chegar ao fim e esta certeza tem que nos resgatar o olhar e encher de esperança. Começa a haver luz ao fundo do túnel com as notícias das vacinas a caminho, mas esta luz não vem só da ciência e dos laboratórios farmacêuticos.

Ao fim de um ano de restrições, condicionalismos, distanciamento social e protocolos sanitários, todos percebemos que um ano já passou. Mesmo que seja preciso mais um ano das nossas vidas, agora temos a medida do tempo. E sabemos mais do que sabíamos à partida.

Muitos de nós entrarão em 2021 com lágrimas pelas perdas de familiares e amigos que partiram e deixaram saudades. Muitos de nós continuamos aflitos pela falta de emprego, pela saúde precária, pela fragilidade dos que nos são próximos, pela vulnerabilidade de quase todos.

Ninguém esteve nem está ainda completamente imune ao vírus, assim como nenhuns se podem dar ao luxo de achar que o pior só acontece aos outros. O Papa Francisco disse que estamos todos na mesma barca e nós sabemos, porque sentimos, que estamos todos no mesmo mar. Uns a afogarem-se à nossa vista, outros a tentarem manter-se dentro da barca, mas todos no mesmo mar.

E se estamos todos no mesmo mar, porque não usar este mês de Dezembro para fazer propósitos resgatadores, para nos atirarmos às ondas como se fossemos nós os salva-vidas? Está na nossa mão fazê-lo, não depende de mais ninguém a não ser da cada um de nós. Podemos salvar muitas vidas no sentido literal e metafórico. Podemos dar do que temos e somos, podemos prescindir de bens materiais, podemos ficar mais atentos aos que se sentem afundar.

É também para isto que serve o mês de Dezembro: para nos fazermos presentes. Para nos darmos, para nos doarmos aos outros com gratuidade e, assim, celebrarmos um verdadeiro Natal.

Não podemos juntar-nos como sempre juntámos? Não podemos andar de loja em loja a comprar coisas para oferecer? Não podemos ir pela estrada fora até à aldeia ou cidade das nossas raízes? Nossa Senhora também não teve confortos e sentiu-se certamente muito só e muito isolada quando todas as portas lhe foram fechadas.

Talvez este seja o ano em que finalmente celebramos o Natal em comunhão com Nossa Senhora, São José e o Menino. Com a Sagrada Família que nada tinha para além da certeza do amor de Deus e de uns pelos outros.

Dezembro é o mês da grande luz que nos ilumina. Agradeço esta luz e peço a Deus que não me deixe apagar a estrela que brilha no Alto.

 

P.S.: O título desta crónica tem a ver com o facto de este ser, para mim, um texto de despedida, abraços, balanços e saudades. Ao fim de um ano de escrita, despeço-me dos leitores com abraços e saudades. Infelizmente não consigo manter a escrita regular, mas parto com um até breve! E parto com saudades...

 

Laurinda Alves, Jornalista, escritora, tradutora e professora universitária de Comunicação, Liderança, e Ética

(In Voz da Fátima, Ano 099, N.º 1179, 13 de dezembro 2020) 

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